"Estes amam o povo, mas não desejariam, por interesse do próprio amor, que saísse do passo em que se encontra; deleitam-se com a ingenuidade da arte popular, com o imperfeito pensamento, as superstições e as lendas; vêem-se generosos e sensíveis quando se debruçam sobre a classe inferior"(...)"Há também os que adoram o povo e combatem por ele mas pouco mais o julgam do que um meio; a meta é o atingir o domínio do mesmo povo por que parecem sacrificar-se; bate-lhes no peito um coração de altos senhores; se vieram parar a este lado da batalha foi porque os acidentes os repeliram das trincheiras opostas ou aqui viram maneira mais segura de satisfazer o vão desejo de mandar"Agostinho da Silva: Ir à Índia sem Abandonar Portugal; Considerações; Outros Textos
Estes dois parágrafos isentam o pensamento agostiniano de qualquer vinculação à "Esquerda" ou à "Direita"... Associado à Esquerda depois do seu exílio forçado provocado pelo antigo regime Salazarista, Agostinho foi classificado como alguns como "Esquerdista". Associado à Direita por outros - porventura desiludidos com a sua falta de alinhamento - devido às referências frequentes de Agostinho a um "outro Portugal" e ao "Quinto Império", quiseram ver nele um Nacionalismo filiado à Extrema Direita e cometeram também eles o erro de enclausurarem Agostinho da Silva na apertada gaiola das classificações Direita-Esquerda...
Nada mais errado. Agostinho move-se acima destas limitações e bebe a maior parte da influência do seu pensamento político no Portugal Medieval, não em construções abstractas erguidas nos finais do Século XIX a partir do alinhamento (Esquerda) ou da Oposição (Direita) ao pensamento de Karl Marx.
Estas duas frases, escritas sempre naquele estilo simples e despojado a que nos habitou Agostinho, ilustram bem o que pensava o filósofo sobre aqueles que da Direita preferiam manter o Povo domesticado, mas contido, na suas capacidades e influência dentro da Sociedade, tornando-o numa coisa inferior e obviamente inferior à posição que eles próprios ocupam na Sociedade. O segundo parágrafo, critica a posição das "Esquerdas", onde em nome do Povo de estabelecem "Ditaduras do Proletariado" e onde em nome de Utopias futuras se realizam as maiores barbáries e sacríficios no cumprimento de uma verdadeira vocação parareligiosa que só pode ser satisfeita num Além, neste caso, no Além do Comunismo, que urge alcançar a todo o custo, sobre todos os sacrifícios e incluindo nestes a Liberdade Individual, a Liberdade de Expressão e todo o mais que se julgar necessário sacrificar.
Na verdade, uma e outra formas de encarar o Povo (este capítulo chama-se muito apropriadamente de "Amor do Povo") são formas de exercer o "Mando", meios apenas para obter um fim, que é o Poder. Pretextos, para manter o "Povo" submisso e subalterno, em diferentes modelos de sociedade, mas semelhantes, na existência de uma Élite detentora única do Poder, que exerce a seu bel prazer, a pretexto do "Bem Comum" que só ela se julga capaz de identificar.
Essa Élite existe hoje em Portugal. E exerce o seu mando a partir do Parlamento, dos Media, da Presidência, dos Tribunais... É essa Élite que tem mantido Portugal pequeno e submisso, para que ela própria possa continuar a exercer o seu Império.